segunda-feira, 9 de maio de 2011

conto em interrogação

que dizes do dia de hoje,
do espelho por onde te miras quando acordas,
do lavatório onde deixas descansar a lâmina da barba,
enquanto limpas o golpe que, sanguíneo, te mancha a toalha
antes alva?

que dizes do dia de hoje que perdeste nos ponteiros do relógio,
no fumo do cigarro que não te lembras sequer de queimar,
que se te esvaiu das mãos como areia da ampulheta que não te disseram
que iam virar?

que dizes do dia de hoje que passou,
que passou nas melodias da rádio,
nas folhas do jornal, no café quente,
nas palavras que disseste, nas que não pronunciaste
e nas de que não te lembraste?

que dizes do dia de hoje,
dos outros que não viste,
dos de cuja alma ou carne sequer te apercebeste?

está bonito, que o céu está limpo.
está bonito porque a lua está luminosa, pálida,
e a noite cálida.
está bonito o dia,
que não poderia ser diferente,
não existindo outra gente.

embora o espelho não tenha reflexo
e a tua toalha da manhã continue branca.

- sem título -

caído no chão,
um corpo,
é meu.
evisceração.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Semente

trago nas mãos uma semente
saída do nosso sangue,
saída do nosso ventre.
trago nos punhos uma força
saída das nossas lágrimas,
amassada nas nossas esperanças.
trazemos no peito a falta de vergonha
por para ela não termos motivo,
no rosto o sorriso
a revolta na alma.