quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

guerra de classes

vibram-me as cordas vocais e os pulmões,
com um clamor, como um tambor,
de alegria, de dor,
de raiva, despudor,
vibram-me as sinapses,
os gritos, os punhos cerrados,
e os olhos raiados,
na luta, até à vitória,
vibrem átomos, morram quimeras,
na luta, até ao fim de todas as guerras,
feita de muitas batalhas em todas as terras.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

navegação

será o vento a trazer-me o teu nome
nos dias de esquecimento.
será o teu nome a lembrar-me de quem sou
nas noites sem estrelas.

da poesia

os poemas são as nossas dores escritas em letras.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Lisboa

um barco no tejo,
um abraço,
um beijo,
ao longe uma ponte sobre os telhados
inúmeros, antigos, confusos.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

- sem título -

por que é que as palavras não se respiram?
inspirar
expirar
até à última.

domingo, 4 de dezembro de 2011

- sem título -

as pontas dos meus dedos suaves
sobre a pele das tuas ancas
e o meu sussurro atrás do teu corpo nu,
sopra-te no ouvido a palavra absolutamente
necessária.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

ausência

a mensagem do silêncio é a totalidade.

- sem título -

enchi o peito com o fumo na mesa do café, quando ainda se podia fumar nos cafés, e olhei para uma outra mesa.

sobre a mesa um cinzeiro vazio, uma bolsa de mulher e um café. ela estava, com os cabelos louros, olhando na direcção da porta como se esperasse alguém.

a minha chávena estava já quase fria, depois de sorvido o líquido negro e quente e os meus olhos, fingindo-se atentos às pequenas letras do jornal, já nada faziam senão cairem para aquela singularidade que, impossivelmente, estava sentada uma ou duas mesas ao lado da minha. estranhos acasos nos reserva a vida, colocar-nos ali, um mendigo e uma rainha separados por uma mesa de café.

quando ela levantou os olhos, jurei que tinha sido para mim. um sorriso abriu-se nos lábios e fê-la mais radiante, com uma pequena ruga no canto do olho, daquelas que aparecem quando os sorrisos são sinceros.

então, nervoso, inspirei o último travo do fumo, pensei levantar-me. as pernas reagiram. antes disso, quando me tirava da cadeira, passou por mim quem acabara de entrar e sentou-se com ela.

ainda assim, ainda que por breves momentos, por dentro, exaltei-me enganado, pensando que era um sorriso para mim. como enganado está quase sempre quem se exalta.

domingo, 27 de novembro de 2011

- sem título -

todo o passado é o que nos enche, mesmo o que nos deixa vazios.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

o tempo no poema

em cada letra do verso, está uma flor que que não definha.
em cada sílaba, um beijo que não desvanece.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

vermelho

ígneos nossos punhos, nossas almas.
flamejantes nossos hinos, nossas lágrimas.
vermelhos nosso sangue, lutas e vitórias.
fortes nossos braços na conquista,
a almas, punhos,
lágrimas, hinos,
lutas e sangue,
do triunfo e da nossa glória.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

- sem título -

os versos são as folhas caídas das árvores
sobre a água de um lago no outono.

onde afundam ondulantes.

queremos ouvi-los crepitar sob nossos pés,
mas uma barreira líquida e transparente opõe-se-nos
como todo o ar que se coloca entre nós e o céu.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

fado

do fado o que sei
quando ecoa
nas travessas e vielas,
nos bairros de Lisboa?

do fado o que sei
- nada sei .
além dessa voz que me acende?

e dessa guitarra que dedilha
versos no escuro?

do fado apenas sei que,
na tua voz e nesses versos,
ouço a cantiga do meu povo.

(que em Lisboa
se entoa.)

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

- sem título -

soltam-se-me dos dedos
as sílabas
como lágrimas dos olhos
de quem chora.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

- sem título -

nenhum ser humano é vazio,
somos é todos cheios de coisas diferentes.

sábado, 8 de outubro de 2011

verso fractal

ao contrário do universo,
este verso é infinito.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

- areia -

a vida é feita do mesmo que a areia,
grão a grão, escapa-se-nos por entre os dedos,
por mais que a apertemos.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

- sem título -

já não há andorinhas
e ninguém me diz porquê.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

poema passageiro

dentro meu peito vivem animais
de garras dilacerantes.
dentro do meu peito batem asas
morcegos ou vampiros.
porquanto a dor nos consome as veias,
e o negro nos cobre as almas,
tudo é escuro, como a negritude.
vale-nos que nascerá da esterilidade
sempre
o sorriso de existir e poder sentir
que não há sentido na luz se não vivermos a escuridão.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

versus

para viver temos de morrer.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

- sem título -

o sol hoje nasceu de noite
ou então não surgiu pela alvorada.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

- sem título -

trago o peito aberto, porém o sangue não brota nem jorra.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

amanhã

curta é a viagem quando desejamos a lonjura.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

- sem título -

amo as tuas palavras,
as tuas gotas de chuva sobre mim,
amo o teu sussurro pela noite,
a lua na janela enquanto me amas.

amo como me me amas sem fim.

domingo, 3 de julho de 2011

- sem título -

enquanto me vejo ao espelho,
trespasso-me pela translucência
e só vejo a parede vazia atrás de mim.

um dia, surgirei opaco,
até lá trabalho a substância e o sangue
e deixo o ar respirar-me, sem fim.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

alameda

ele passeou pela estreita alameda, sob a sombra das árvores. a pele dura recebeu o fresco e suavizou a sua aspereza.

os raios de sol tornaram-se mais e mais oblíquos, até que a lua surgiu por sobre as copas como coroa luminosa.

e entrecortada pelos passos, a luz, afirmava-se cada vez mais distinta, porque a escuridão se fechava mais densa.

terça-feira, 28 de junho de 2011

- sem título -

há dias em que é impossível escrever,
porque as letras fugiram.
talvez porque tenham abandonado as mãos,
ou fugido com a embriaguez dos dias felizes.
há dias em que é impossível escrever,
porque os versos se encravam na ponta dos dedos,
ou mesmo nas entranhas onde não se deixam ver.

há dias em que é impossível escrever,
porque a inspiração, talvez, se tenha ido dissolver
numa expiração.

há dias em que é impossível escrever
porque a vida te afoga em silêncio as estrofes,
porque a tinta da alma se te esvai,
e tu à distância, podes apenas ver a mancha
que ela deixa pelo caminho.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

- sem título -

ai esse abraço
que dura por querido
que aperta sentido
e é um beijo.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

bravos os que lutam

levantemos nossos punhos como lanças,
nossas almas como muralhas,
ergamos nossos rostos como bandeiras de vitória,
mesmo quando formos derrotados,
que nestas batalhas de pão e dignidade,
resistir é já brava conquista.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

humanidade

caído aos pés de deus,
o homem renegou ao demónio.
extenuado, vencido,
prostrou-se ao poder magnânimo
do relâmpago e do trovão.


e a humanidade, assim vencida, abandonou-o.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

- sem título -

as nossas mãos, na verdade, são asas.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

conto em interrogação

que dizes do dia de hoje,
do espelho por onde te miras quando acordas,
do lavatório onde deixas descansar a lâmina da barba,
enquanto limpas o golpe que, sanguíneo, te mancha a toalha
antes alva?

que dizes do dia de hoje que perdeste nos ponteiros do relógio,
no fumo do cigarro que não te lembras sequer de queimar,
que se te esvaiu das mãos como areia da ampulheta que não te disseram
que iam virar?

que dizes do dia de hoje que passou,
que passou nas melodias da rádio,
nas folhas do jornal, no café quente,
nas palavras que disseste, nas que não pronunciaste
e nas de que não te lembraste?

que dizes do dia de hoje,
dos outros que não viste,
dos de cuja alma ou carne sequer te apercebeste?

está bonito, que o céu está limpo.
está bonito porque a lua está luminosa, pálida,
e a noite cálida.
está bonito o dia,
que não poderia ser diferente,
não existindo outra gente.

embora o espelho não tenha reflexo
e a tua toalha da manhã continue branca.

- sem título -

caído no chão,
um corpo,
é meu.
evisceração.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Semente

trago nas mãos uma semente
saída do nosso sangue,
saída do nosso ventre.
trago nos punhos uma força
saída das nossas lágrimas,
amassada nas nossas esperanças.
trazemos no peito a falta de vergonha
por para ela não termos motivo,
no rosto o sorriso
a revolta na alma.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

liberdade

tenho preso o futuro dentro das mãos
trago no cérebro a força criativa dos homens
e não posso libertá-los enquanto for cativo
do passado, do presente e dos patrões.

sábado, 9 de abril de 2011

mar emergente

o mar é a gente
quando se levanta.

segunda-feira, 21 de março de 2011

poesia

nos meus versos não encontras
faunos, nem musas,
nos meus versos não cantam sereias,
nem há florestas clássicas inspiradoras.

não há decassílabos,
nem ritmo nem tónicas,

mas há fogo,
e há letras ígneas.
há lágrimas, sorrisos, choros e gritos.
nos meus versos não encontras formas,
apenas poesia.

sexta-feira, 4 de março de 2011

vencer (futuro do indicativo, futuro do conjuntivo)

eu vencerei tu vencerás ele vencerá
apenas e só se nós vencermos.

quinta-feira, 3 de março de 2011

- sem título -

é tão fecundo o vazio.

conjugar (presente do indicativo)

eu conjugo tu conjugas ele conjuga
nós conjugamos vós conjugais eles conjugam
todas as forças para vencer a lama
onde nos enfiaram o rosto.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

sem título

sombras e luz.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

vendavais do tempo

enquanto se esvai o tempo,
como areia de um deserto ao vento,
dobram-se cabos de tormentas,
redobram-se forças e revoltas.

que essa areia assentará sempre algures,
no futuro,
algures,
sempre.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

os vampiros

não nos basta saber
que nos roubam o pão,
que contra nós
conspiram escondidos
os parasitas e os assassinos.
não nos basta saber
que morrem de fome os nossos irmãos,
e que os homens livres morrem na prisão.

não nos basta saber que os vampiros
morrem quando páram de chupar-nos o sangue,
é preciso querer e fazer com que eles párem.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

esgota-se o tempo

já não há tempo para que a poesia se dê ao luxo
de passear nos bosques encantados e nos egos poluídos
dos intelectuais de escrivaninha.

já não há tempo para que os versos se ostentem,
bem rimados, construídos, bem ritmados, bonitos,
nos corações vazios da burguesia.

é urgente que as palavras ganhem o peso das pedras,
se revoltem com os que vivem sem poesia e sem pão.
não há tempo para brincar aos poetas, ao depressivo snob en vogue.

só nos resta tempo para que se não nos acabe o tempo,
para que gritemos ainda que não abdicámos do futuro,
com propriedade, ou mesmo sem.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

24 de Janeiro

quando do chão os rostos se levantam,
redobram-se as forças que trazemos nos punhos.

sendo fortes, mais humanos nos tornamos,
e é na rocha mais dura que se apura a dureza do aço.

dos desânimos faremos lanças,
das insuficiências, desafios,
da confiança, vitórias.

triunfo

aqueles que nos construíram o mundo
de hoje e do passado,
não poderiam perdoar que não erguêssemos nós o de amanhã.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

sem título

ser poeta não é ser maior do que os homens.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

parasita

já nos dói a vida do dia-a-dia,
de ficar mais pobre neste sol
que estava ainda na anterior lua.

pago eu a tua barriga gorda,
o inchaço dos teus bolsos,
com a fome dos meus filhos
e minha barriga vazia.

pago com os calos das minhas mãos,
a finura dos teus dedos;
com o suor do meu corpo,
o fresco conforto do teu ar condicionado;

pago com as noites mal dormidas,
o teu sono descansado;
com a renda da minha casa,
as obras que nela nunca fizeste;
pago com o meu desespero,
o teu opulento descanso.

e de tudo quanto faço,
me roubas o maior pedaço.

roubas, roubas, roubas
e vives acima do que posso pagar-te,
bicha solitária, filha da puta.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

sem título

sabemos que o mundo muda,constante, embora lentamente.mas satisfaz-nos saber que, no derradeiro dia, estivemos do lado do progresso e da mudançae não do retrocesso ou paralisação.

sabemos que é difícl a luta,empolgante, porém. mas é-nos grato abraçar quem nela caminha a nosso lado e levanta alto o punho da transformação.

não podemos conhecer o caminho, tampouco saber quanto dele está por percorrer. todavia, o mais importante é termos a certeza de que esse caminho aí está, inevitável.

que melhor fim pode ter um ser humano que não ser, isso mesmo, humano.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

breu

quanto mais negra a escuridão,
mais forte a chama da nossa candeia.